Tuesday, December 27, 2011

Triumph




Que os homens não percebem não percebem nada de mulheres, poucos contestam e quase todos concordam.
Falhamos sempre.
Nas datas, nas prendas.
Que os homens não percebem nada de mulheres, eu não discuto e assino por baixo.
O que me surpreende é a falta de conhecimento que os homens revelam de si próprios.
Os homens que gostam de mulheres, gostam de mulheres.
Pele, carne, lábios.
Os homens que gostam de mulheres, gostam de mulheres que existam. Que nos façam sentir uns merdas. Que nos obriguem a dar tudo.
Os homens que gostam de mulheres, gostam de mulheres.
Cabelo, olhos, sardas.
Os homens que gostam de mulheres, gostam de mulheres que possam ser deles um dia. Que nos façam sonhar. Que nos obriguem a trocar a bola pelos filmes do Gosling.


Os homens que gostam de mulheres, não gostam do cartaz da Triumph.


As miúdas do cartaz da Triumph não são mulheres. São bonecos de cera. Efeitos especiais.
As miúdas do cartaz da Triumph não existem. Não se percebem. Não têm cor.
As miúdas do cartaz da Triumph são feitas de pau. Sem feições.
Os homens que gostam de mulheres, gostam de mulheres.
Mãos, ombros, dentes.
Vontade própria.
As miúdas do cartaz da Triumph ( são várias certo ? não se percebe ) trocaram a autoestima pela fome.
Não se percebem. Não têm cor.
Os homens que gostam de mulheres, gostam de mulheres que nos façam sentir esquecidos. Dedicar-lhes músicas foleiras. Emprestar-lhes o casaco.
As miúdas do cartaz da Triumph não precisam de casaco porque não têm ombros.
As miúdas do cartaz da Triumph são feitas de borracha. Sem brilho.
Só Photoshop e Óleo Johnson.
Os homens que gostam de mulheres, gostam da Luisa Beirão e da Andreia Rodrigues.
E não de esferovite.
O novo cartaz da Triumph não pára transito algum. Não provoca discussões entre casais. Comentários perversos.
As miúdas do cartaz da Triumph não são Portugueses nem de lugar nenhum.
Não ouvem boa música. Não vestem a nossa T-shirt ao pequeno-almoço.
Não fazem pouco dos nossos cozinhados miseráveis.
Os homens que gostam de mulheres, gostam de mulheres.
Gelado no nariz. Olheiras.
Que nos obriguem a trocar a bola pelo jantar da amiga gorda.
Os homens que gostam de mulheres, gostam de mulheres.
Cintura, pernas, peito.
Um coração do tamanho do universo.
Personalidade. Atitude.
E um par de mãos pequenas dispostas às tarefas mais variadas.


“Olhas mais uma vez dou-te um estalo”.

Friday, November 18, 2011



"O que julgas tu saber de mim, nem sequer é verdadeiro.
Menti-te claro. Como não mentir.
Estás tão acima do que esperava. És tão mais do que fiz por merecer.
O que julgas tu ser meu, não me pertence.
Nunca pertenceu claro. Como poderia pertencer.
Estás tão a meu gosto. És tão mais do que eu."

Monday, November 14, 2011

Ana Rita Clara



É estranhamente confortável escrever sobre Ana Rita Clara.
Escrever sobre Ana Rita Clara é escrever sobre todos nós, os que nunca tivemos uma.
Voltar atrás no tempo. Relembrar tudo.
As borbulhas.Os fracassos todos.
Escrever sobre Ana Rita Clara é escrever sobre mim próprio. Sobre as
cartas de amor que foram ficando no meu bolso.
Escrever sobre Ana Rita Clara é perverso, mas carinhosamente
ternurento.
Quase romântico.
Ana Rita Clara é tudo ao mesmo tempo.
Ana. Rita. Clara. Três maldições numa.
Qualquer uma capaz de nos partir a vida ao meio. Um erro tremendo.
Uma estúpida noção de perfeição.
Ana Rita Clara é a melhor das mortes. Serve-se com Bourbougne.
Minuto e meio de Van Morrison.
Não antecipes o refrão. Espera que o faça, e acompanha-a.
Ana Rita Clara é a miúda do banco da frente.
O sorriso de menina que não deveria ter um dono.
Os olhos pequenos. Perfeitos.
O melhor dos fins.
Escrever sobre Ana Rita Clara é perverso, mas carinhosamente ridículo.
Quase patético.
Uma estúpida noção de infantilidade.
Não querer crescer nunca.
Ana Rita Clara é o melhor dos destinos. Serve-se com a sorte necessária.
Minuto e meio já seria perfeito.
Não antecipes nada. Espera que esteja distraída e quem sabe tenhas sorte.
Oferece-lhe os teus apontamentos.
Volta atrás no tempo. Relembra tudo.
Chama-lhe Ana. Rita. Clara.
Diz-lhe que é tudo ao mesmo tempo.
Que o seu sorriso não deveria ter um dono.

E que é estranhamente confortável escrever sobre isso.

Tuesday, November 8, 2011

10-2011



Não há nada em Rita que Mário desconheça.
Conheceram-se novos. Cresceram juntos.
Partilharam.
Não há nada em Rita que Mário desconheça.
Os seus gostos. Os seus medos.
O prato favorito. As paranóias todas.
Rita é uma pessimista. Trabalha muito. Queixa-se ainda mais.
Acha que o mundo vai rebentar. Que tudo é injusto.
Que assim, seja o assim o que for, as coisas não vão para a frente.
Mário ri-se disso. Não há nada em Rita que Mário não suporte.
Diz-lhe que não se preocupe. Que podia ser pior.
Não há nada em Rita que Mário desconheça.
As datas importantes. A alergia a marisco.
O péssimo gosto para acessórios.
-“Viste os meus brincos?”
-“Não, não...”
Conheceram-se novos. Cresceram juntos.
Descobriram-se. Ensinaram-se.
Separam-se.
Mário precisou de tempo. Rita quis conhecer Londres.
Conheceram. Cresceram.
Descobriram. Aprenderam.
Reencontraram-se.
Rita é uma realista. Trabalha menos. Disfruta mais.
Acha que só se vive uma vez. Que tudo tem o seu tempo.
Que o futuro, aconteça o que acontecer, vai ser futuro.
Mário ri-se. Diz-lhe que a quer muito. Embora tenha pouco tempo.
Mário é ocupado. Viaja muito. Dedica-se cada dia mais.
Gostava que o dia tivesse mais horas.
Rita não se importa.
Não há nada em Mário que não suporte.
Diz-lhe que não se preocupe. Que vai esperá-lo sempre.
E que lhe devolva os brincos que escondeu.

Thursday, September 22, 2011



Chama-se Beatriz.
Podia ser Rita, ou Mariana. Mas é Beatriz.
Passei meses à procura do seu nome.
E agora sei que se chama Beatriz.
Beatriz (que estranho nome Beatriz), é mais bonita do que provavelmente merece.
Tem o rosto e mãos pequenas, e uns saltos do tamanho do universo.
Fala e sorri muito.
Apanha o comboio, como todos nós.
Tem uma rotina, um emprego desses.
Beatriz (afinal chama-se Beatriz) fala-me muito de si.
Diz que sofreu muito.
Que o destino lhe trocou as voltas.
Beatriz, que podia ser Sara ou Madalena, tem palavras para tudo.
Julga-se vítima de uma armadilha.
Que de certa forma, sou eu o culpado.
Acha que sou um desastre.
Mas ri-se dos meus crimes.
E segura no meu braço.
Beatriz ( como assim Beatriz?), está mais errada do que provavelmente acredita.
Tem um olhos claros e pequenos, e um desplante do tamanho do universo.
Diz que sofreu muito.


Mas que tem um bonito nome.

Tuesday, September 6, 2011

Novembro.



Um dia, qualquer dia, vais ter a tua casa.
O sítio onde queres passar o resto da tua vida.
Um dia, qualquer dia, vais ter dinheiro para os teus cigarros.
Vais comprar boas gravatas. Bons sapatos.
Dar gorjetas.
Deixar o troco ao senhor do café.
Um dia, qualquer dia, vais ser promovido.
Compras um carro novo.
Fazes obras na garagem.
Convidas os amigos para jantar.
Falas-lhes de como a vida te corre bem.
Do emprego que gostariam de ter.
Da piscina que estará pronta no Verão.
Um dia, qualquer dia, vais poder comer onde te apetece.
Ver o fogo de artíficio da varanda.
Conhecer o mundo aos poucos.
Rio de Janeiro. Paris. Tóquio.
Vais ter uma liberdade muito tua.
O teu espaço.
Vais conhecer mulheres bonitas.
Dormir com elas. Comprar-lhes vestidos.
Teres os affairs que bem entenderes.
Beber bom vinho.
Comprar novos tacos de golf.
Um relógio pesado.
Alguém que te passe as camisas.
Sossego. Conforto. Silêncio.
Um dia, qualquer dia, vais ser o melhor da tua rua.
Admirado no supermercado.
“ - Diz que se deu muito bem por lá! ”
Vais ser convidado para tudo.
Padrinho de mundo e meio. O primeiro da mesa a ser servido.
Vais poder contratar pessoas. Despedi-las.
Levantar a voz no restaurante.
Dizer que não votas em ninguém.
Fazer pouco de quem teve menos sorte do que tu.
Terás as prestações todas pagas.
Dois meses de férias. Mais um aumento.
Um garagem com menos espaço.
Mais gravatas. Mais um relógio.
Alguém que te corte a relva.
Vais ter gente atrás de ti.
Gente para ti.
Um telefone em cada mão.
Vais trabalhar mais.
Visitar menos os teus pais.
Passar mais tempo no ginásio.
Querer parecer mais novo.
Vais ter muitos encontros.
Sara.
Sofia.
Cláudia.
Mariana.
A Rita, que te ajudava com a Matemática no Liceu.
A Filipa que agora é enfermeira.
Vais ter um escritório maior.
E achar o mundo demasiado fácil.
Que não te falta nada.
Até que um dia, talvez nesse mesmo dia, acordarás sozinho.
No teu espaço.
Com os teus dois telefones.
Sem a Sara. A Sofia. A Cláudia. A Mariana.
A Rita, que ensina Matemática num Liceu.
A Filipa que mudou de turno e de vida.
E vais querer gente ao pé de ti.
Gente por ti.
Vais cansar-te do silêncio.
Do sossego. Do conforto.
Dessa liberdade muito tua.
Vais perceber que te falta tudo.
E um dia, qualquer dia, vais perceber que ainda há tempo.
Que há sempre tempo.


E começas tudo de novo.

Wednesday, June 15, 2011

.



"Foi difícil chegar a ti.
Muitas perguntas, muita gente pelo meio.
Julguei que o destino não nos queria.
Que nunca saberias que existo.
Foi difícil falar contigo.
Estar à tua altura.
Fazer-me ouvir.
Saber coisas tuas.
Explicar-te porquê tu.
Perguntar-te porquê eu.
Tiras as dúvidas todas.
Tocar-te no rosto, se me deixares.
Olhar-te muitas vezes nos olhos.
Pagar-te o jantar.
Fazer-te bigodes com a espuma do café.
Imitar a tua voz quando falas ao telefone.
Rir-me das tuas histórias.
Estar apenas.
Disfrutar de ti. Chamar-te princesa.
Babe não, que é foleiro.
Opinar sobre o teu vestido.
Perguntar-te porque escolheste essa cor para as unhas.
Como consegue o teu cabelo ser tão claro.
Falar-te das minhas tatuagens.
Escondê-las daquelas mães que tratam os filhos por você.
Estar somente ali.
Não te pedir nada.
Foi tão difícil chegar a ti.
Devia escrever-te uma canção.
Uma poema não, que é foleiro."

Wednesday, June 1, 2011

Crónicas ao acaso III - Paris



“Querida Henriette,

Passou muito tempo desde a última vez que nos vimos.
Tempo a mais diria.
Cruzar-me contigo foi cruzar-me com o melhor de mim próprio. Um lado que eu mesmo desconhecia.
Podia escrever-te para te dizer que tenho saudades. Que sinto a tua falta.
Podia relembrar-te o que passámos juntos. Podia falar-te de Paris, claro.
Da tua cabeça no meu ombro, sempre.
Da casa daquela tua amiga esquisita que só comia peixe de rio. Do vinho que o teu avô te deixou, e que quiseste partilhar comigo.
Podia, claro, dizer-te que é o teu corpo que procuro em cada corpo que vou conhecendo.
Que, mesmo hoje, gostava de ver-te. De saber de ti.
Podia confessar-te que guardo, intactas, todas as tuas cartas.
Que as tuas palavras ainda me são caras. Que imaginar-te com outro custa.
Que lhe caiam os dentes todos.
Podia dizer-te que rasguei a própria pele para eternizar a tua expressão de vida.
Il fault que jeunesse se passe.
E isso justificava a merda que fazíamos juntos.
Podia, como tantas vezes, falar do tamanho do salto dos teus sapatos, que nunca me meteram medo.
Era perto do céu que eu te queria.
Podia deixar que fizesses pouco do meu terrível sotaque francês. Lembrar-te a forma como os teus amantes me olhavam. De como o teu pai queria partir-me um braço.
Podia cantar para ti aquelas músicas todas. Repetir um dos meus cozinhados horríveis.
Podia falar-te da tua janela por onde entrei e saí tantas vezes. Podia dizer-te que estás presente.
Que me lembro de ti sempre.
Que te vejo em todo o lado.
Podia tentar fazer diferente, como nunca tentei enquanto estiveste perto.
Mas o que quero mesmo é escrever-te.
E um dia ouvir-te de novo.”

Monday, May 30, 2011

Crónicas ao acaso - II



“Meu amigo vendo-lhe isto como se fosse p´ra mim!”.
Ao ouvir isto percebi que era tarde de mais. Tinha sido enganado.
Trafulhice pura. Sexo não consentido.
Foi há um ano quando o destino me obrigou a comprar um carro novo.
“Destino” é o que chamo à companhia de seguros que deu pelo meu carro o mesmo que eu dei pelo meu bonsai interior.
O acidente, muito simples. Dois carros, um cruzamento. Eu vi o stop, uma senhora de 78 anos não.
O vendedor de carros era, como todos os vendedores de carros, um gajo simpático. Chamava-se Mário e contou-me toda a sua vida. Era casado pela 3ª vez e tinha combatido no Ultramar. Quando me abriu o capot do 1º carro, perguntei-lhe se o carro tinha combatido a seu lado.
Soltou uma gargalhada e mostrou-me um outro.
Preto, baixinho, sem capota. Uma quase “bomba”, ideal para gajos com a minha carteira ou com a cara do Mário conseguirem companhia para o cinema.
Sentou-se no carro e obrigou-me a sentar-me também. Começou a mexer em todos os botões e a explicar-me para que serviam. Eu ia acenando com a cabeça e contava os segundos para fugir dali.
-“Repare no rádio, basta rodar o botão do Tune com o indicador e ele vai procurando automaticamente os postos”, explicou.
-“Então mas isso não fazem todos?”
-“Com esta qualidade? Nada disso amigo!”.
Quando me chamou amigo percebi que estava a ser enganado de novo.
A segunda violação da tarde.
Fingi que acreditei,claro.Acenei com a cabeça e assisti ao resto da palestra.
Durante hora e meia mostrou-me o carro de lés-a-lés.
Comprar um carro é como terminar uma relação com alguém que apesar de tudo nos diz muito. Pondera-se, pondera-se, pondera-se. Pesam-se todos os prós e contras, decide-se.
E no fim sentimos sempre que optámos mal.
Assinei uma dúzia de papeis e lá comprei o carro. Preto, baixinho, sem capota.
Uma quase “bomba” que de facto nos impede de ir ao cinema sozinhos.
Nunca percebi se o negócio tinha sido realmente mau. Livrei-me do carro passado um par de meses.
“Livrei-me” é o termo que uso para apelidar o amor mais efémero da minha vida.
O acidente, muito simples. Dois carros, um cruzamento.
Um senhor de 45 anos viu o stop.

Eu vinha a brincar com o rádio.

Sunday, May 22, 2011

Crónica ao acaso I



"Sair à noite sozinho é novo preto", disse-me alguém em quem confio muito.
A última grande moda.
Duvido sempre das modas. E resolvi ir comprovar por mim próprio.
Lisboa foi, como sempre, o palco. O sítio, conhecido como poucos.
O melhor casaco. Os sapatos certos.
Quilos de perfume.
Entrar sozinho foi já de si humilhante.
-"Boa noite, quantos são?".
-"Sou só eu".
O senhor que estava à porta, "simpático" como costumam ser todos, deixou-me entrar em grandes perguntas.
Tudo estava igual desde a última vez que lá tinha estado há alguns meses.
Pouca luz, puffs coloridos e sobrelotados.
Pequenos grupos de gente bem cuidada. Os senhores com as esposas na cama e senhoras com os esposos em Angola.
Um casal bem novinho aos beijos. Ela em pé, ele sentado (pudera).
Tudo normal.
Aproximo-me do balcão e peço o costume. Pela metade e com pouco gelo.
A rapariga que me atende, bonita como costumam ser as raparigas que atendem, tem um olhos do tamanho do mundo.
Morena, cabelo escuro, e uma dessas tatuagens japonesas no ombro.
-"É tudo?", pergunta.
-"Sim, vim sozinho".
-"Vens sair sozinho?"
-"Sim, é o novo preto. A última grande moda"
Ela sorriu, deu-me o meu troco e atendeu o gajo do lado.
Se com amigos era um desastre na arte do engate, sozinho sou ridículo.
Terminei o primeiro copo e pedi o segundo.
Ela sorriu de novo. Serviu-me e aproximou-se do meu ouvido.
"Se te aguentares depois deste, saio daqui a uma hora".
Eu nem queria acreditar. Um cliché enorme por certo, mas quem sou eu para discuti-lo.
Terminei o segundo copo e pus-me dali para fora.
Saí por onde tinha entrado e esperei por ela à porta a dançar a música vinda lá de dentro.
Até o DJ estava do meu lado. Van Morrison.

Well it´s a marvelous night for a moondance
with the stars up above me in your eyes
a fantabolous night to make romance...

Ela cumprimentou os senhores da porta, que me acenaram como que cumprimentando-me pelo feito.
Beijou-me como se os meus lábios fossem velhos conhecidos, e pediu-me que a levasse a casa.
Era pelo menos isso que eu esperava. Ela não apareceu.
Esperei horas e nada.



Telefonei a um amigo, e pedi-lhe que me fosse buscar.

Tuesday, May 3, 2011

03-05-2011



Hoje não a vi á janela.
Esperei horas escondido.
Saiu e entrou montes de gente.
Ela nada.
Sabia que este dia chegaria mais cedo ou mais tarde.
Que um dia pagaria por tudo.
Hoje não a vi à janela e sei que não a verei mais.
Custa-me muito claro. Não lhe disse tudo.
Nunca lhe disse tudo. Fui guardando muita coisa.
Palavras que ficaram para mais tarde.
Cartas. Piadas velhas.
Um poema foleiro num guardanapo:
Tu, que não és mais do que isso mesmo,
és para mim, tudo.
Braços, pernas, olhos e boca.
Um sonho, que é pesadelo ao mesmo tempo.
A morte mais doce de todas.
Um lenço bonito vermelho, que nem eu sei de onde vem.
O talão do nosso primeiro jantar.
Dois bilhetes de avião,
o Gets Next To You do Al Green,
sandálias,
uma Leica,
uma camisa de dormir,
um pack de Camel,
fotografias,
do Inverno, claro.
Intrigava-me o seu fascínio pelo Inverno.
O sorriso que trazia na cara quando chovia a potes.
Tenho também o seu guarda-chuva.
Nunca o usou. Odiava.
Hoje não a vi à janela e sei que foi de vez.
Que o meu tempo acabou.
Que nunca lhe devolverei o que é seu.
Que nunca saberá a verdade.
Que é, para mim, tudo.
Um pesadelo, que foi sonho ao mesmo tempo.
A morte mais doce de todas.

Thursday, April 14, 2011

14-04-2011




O que dizem eles não me interessa.
É contigo que eu quero conhecer o mundo.
Apertar a tua mão com a minha. Ter a tua cabeça no meu ombro.
Ouvir música lamechas. Partilhar pretzels e projectos futuros.
Opinar sobre os teus sapatos. Escrever-te bilhetes, como fazem os putos.
Desligar o telemóvel.
Mandar, contigo, o mundo à merda.
Sentar-me contigo no passeio. Contar-te as minhas histórias.
Fugir do teu pai pelas traseiras.
Encher-te de sushi enquanto não te puder levar ao Japão.
Escrever a nossa história.
Dois gatos, um mesmo telhado.
Fotografar as tuas caretas. As tuas pernas bonitas.
Encher-te a parede de polaroids.
Ouvir as tuas lamúrias.
As tuas amigas, que deixaram de o ser.
Tentar sempre ser melhor. Seduzir-te todos os dias.
Ter ciúmes. Muitos.
Mostrar-te os meus textos.
As tatuagens novas.
“Isso nunca mais pára?”
Sorrir com as tuas birras. Silenciá-las com um beijo.
Trazer-te nos meus braços.
O que eles dizem não me interessa.
E estejas tu onde estiveres, eu estarei por perto.
É contigo que eu quero conhecer o mundo.

És tu quem vale a pena.

Wednesday, April 6, 2011

03h00



Esta, é a minha carta para ti.
As minhas melhores palavras de hoje.
O meu melhor.
As minhas saudades.
As lembranças todas.
Do teu sorriso que me tirou das trevas. Da forma como enfrentas os problemas.
Como fazes deles coisas menores.
Foste tu quem me carregou nos braços.
Eu não fazia ideia do que era isso, de correr por prazer.
Ser feliz todos os dias.
Naquele canto escondido de Lisboa.
Aquele péssimo sofá, e a cama de corpo e meio, onde o meio não poderia ter o meu tamanho.
As minhas mãos perto das tuas, quentes como tudo.
Os meus pés, frios e com falta de espaço, com aquelas meias horríveis que tu tanto detestavas.
A torneira da cozinha, que chorava durante a noite.
Um mundo que desabava todos os dias, e tu ali.
À minha espera para jantar.
Dizias-me que o amor vence tudo. E eu ia acreditando.
Nos dias perfeitos.
Na felicidade que caiu do céu.
Escolhermos as minhas gravatas juntos, sem concordar numa que seja.
Rir muito. Fazer pouco dos outros.
Os "fantasmas" como lhes chamavas.
"O amor deles tem demasiadas regras".
A cor dos teus lábios.
O pingo de gelado no teu nariz, que eu limpava com o meu dedo.
A tua mão no bolso do meu casado.
Os filmes horríveis que escolhíamos à sorte. Os discos que me oferecias sem ouvir primeiro.
"Mas a capa era tão bonita!" .
As tuas posses ao espelho, com a minha camisola vestida.
E sobretudo sem ela.
O teu vestido azul escuro.
As tuas saudades. Os vizinhos que nos mandavam parar com o barulho.
A tua t-shirt dos Kiss.
Os teus olhos. Morria e matava pelos teus olhos.
O teu sorriso do outro lado da rua à espera que ficasse verde.
As minhas palavras de hoje são, como sempre, tuas.

E farás delas o que entenderes.

Sunday, February 20, 2011

Sedoxil


Perder alguém de quem se gosta dói muito.
Dói sempre.
É uma janela que fechaste para sempre,e não há copo ou companhia que mude isso.
Tens os teus amigos, tens o teu trabalho, e tens o tempo claro, que esperas que cure tudo.
E que por vezes cura.
Perder alguém de quem se gosta é uma merda.
Um vazio incrível. Um mundo de sonhos e planos que te escapam por entre os braços.
A sensação que nos perdemos a nós próprios. Um medo imenso.
Saudades, claro.
E recordações que também são feridas.
Vidros partidos espalhados por todo o lado.
Perder alguém de quem se gosta é todo um mundo novo.
Cinzento. Triste.
Um silêncio assustador.
Um ferro que te encostam ao peito, enquanto te arrancam da carne a pessoa que foste durante todos estes anos.
E com essa pessoa, a outra. A que julgavas ter por perto o resto da tua vida.
Perder alguém de quem se gosta é aprender a caminhar de novo.
Devagar e a medo.
Um dor que se disfarça mal.
Podes vingar-te na bebida ou nos prazeres que abdicaste ao longo destes anos.
Estudas música, viajas muito, compras um fato novo.
Continuas a perder peso, e paciência para as pessoas.
Não queres estar parado.
Gastas dinheiro de forma inútil, exageras no exercício físico.
Manténs-te sempre ocupado.
Até que um dia, ao sair de casa, vais esquecer-te da tal janela aberta.
Deixar que a vida, aos poucos, te entre pelo quarto.
O mundo vai perdendo os tons de cinzento.
E levará com ele todo aquele silêncio.
Terás o quarto e o coração cheio de pessoas.
Aquelas que sempre estiveram por perto.
E as que, pouco a pouco, te entraram pela janela dentro.

Friday, February 4, 2011

Plus d'une erreur


Não faz qualquer sentido.
Porquê eu? Não posso ser eu.
Como não sabe explicar?
Tem de saber explicar.
Ter-me escolhido foi para além do seu maior erro, a coisa mais bonita que me aconteceu na vida.
Sempre falhei demasiado. Desde miúdo.
Nunca marquei golos e era sempre o primeiro a ser encontrado.
“1,2,3 este nunca salva ninguém".
Médio na escola,
demasiado distraído,
o último da fila no bate-pé.
Os bolsos sempre cheios de sonhos.
Tenho um carro velho.
Uma máquina que faz um café horrível.
Gosto de coisas que nem te interessam.
Não faço a barba,
não passo calças a ferro,
detesto musicais.
Detesto pesca também,
e o teu pai odeia-me por isso.
Sei que foi ele que me deitou o livro ao rio.
“Poesia não enche o peito a ninguém!”
Tenho um emprego vulgar,
pernas demasiado estreitas,
e sou, sem dúvida, o mais feio dos meus amigos.
Sou terrível com datas,
não conheço ninguém famoso,
nunca fui a Nova Yorke,
fico cheio de sal no nariz quando como as batatas do pacote.
Sou péssimo a demonstrar ciúmes,
nunca adivinho o teu perfume,
bebo água directamente do jarro,
e passo a vida a esquecer-me de dizer o quão linda estás de manhã.
Não vou ser promovido em breve, e tu não queres nem saber.
Não te importa o que bebo ou tomo.
Carregas-me sempre sobre esses teus ombros pequenos, seja qual for o destino.
E ao deitar, se estou cansado e adormeço enquanto me contas como foi o teu dia, tu sorris.
Sorris sempre.



E guardas as tuas histórias para amanhã.

Wednesday, January 26, 2011

26 / 01 / 2011


Escrever, escrever, escrever.
Escrever por escrever.
E apenas por ter escrito.
Escrever para que saibas que escrevi.
Que ainda guardo em mim palavras tuas.
Escrever escrever escrever.
Escrever sem parar.
Escrever para sempre.
No papel e sobre a carne.
De dia e de noite.
Para o mundo e para o bolso.
Para o inferno onde me deixaste.
Escrever de medo e de fome.
E ter sempre fome de escrever mais.
Escrever,escrever,escrever.
Sobre todos os teus passos.
E os meus, quando andava por perto.
Escrever escrevendo.
Escrever sonhando.
Escrever, escrever, escrever.
É o que a vida quis para mim.
E só.
Escrever por mim e escrever por ti,que me deixaste a escrever sozinho.
Escrever,escrever,escrever.
E encontrar-te um dia destes.

Numa folha qualquer.

Sunday, January 23, 2011


Gostar dela e querer tê-la por perto para sempre.
Oferecer-lhe presentes.
Tornar cada dia diferente.
Envelhecermos juntos.
Cozinhar para ela.
Provar a sua tarte horrível vezes sem conta e dizer sempre que está óptima.
Bebermos vinho tinto até cair para o chão e, cheios de lama na roupa, trocar alianças ou abraços.
Ser amigo. Ser parceiro.
Contar-lhe sempre a verdade.
Que não era o mais forte da escola e que me fartei de levar pancada quando queria impressionar as miúdas.
Contar-lhe todos os meus segredos e mostrar-lhe as minhas cicatrizes.
Comprar um enorme sofá vermelho e fotografá-la nele vezes sem conta.
Guardar o seu sorriso no peito e levá-lo todos os dias para o trabalho.
Dizer que a sua pele continua perfeita ao fim de tantos anos.
Usar o meu melhor fato quando vamos ao teatro. Sorrir para a senhora da bilheteira só para a ver com ciúmes.
Vê-la a acenar da janela quando enfrento o frio cá fora, e provo que ainda sou um gajo forte.
Conhecer de norte a sul o seu corpo, e perder-me por lá.
Vezes sem conta. Propositadamente.
Fazer das mãos dela as minhas, e encostá-las ao meu peito.
Dizer-lhe que vou, mas volto.
Com o seu sorriso à minha espera.

Wednesday, January 19, 2011


Não funcionou.
Não tinha como. Foi muita coisa.
Não falo dos anos, esses passaram por nós a correr e da forma mais prazerosa possível.
Não funcionou, não tinha como, e agora estou aqui sozinho neste quarto do tamanho do mundo.
Não mudei nada. Esperei que o tempo tratasse de tudo.
Não tratou, claro.
Eu, continuo igual. Com tudo aquilo que tu odeias.
Não aprendi a estrelar ovos nem a cortar a relva.
Continuo a andar em casa em cuecas, e a exagerar no ketchup .
Continuo a escolher as gravatas erradas de manhã, e a chamar nomes às pessoas no trânsito.
Continuo a fumar muito. Na cozinha também.
O chão do estúdio continua cheio de livros. Os discos que o teu irmão me emprestou e que nunca mais devolvi.
O pior é mesmo a roupa.
Passar a ferro é difícil . As calças basta sacudir, mas as camisas...
Estar sozinho não é mau.
Voltei a usar o meu casaco de cabedal, que tentaste esconder no fundo do caixote duas vezes .
Esse mesmo.
Não vejo novelas nem como bróculos.
Os domingos deixaram de ter manhãs.
O quarto para além de maior, deixou de cheirar a Zara.
E a insenso.
Estar sozinho não é mau. O pior é ver-te.
A ti e ao gajo que te traz pendurada no braço, e que o usa o outro para me acenar.
O filho da puta.
Que o que sinta por ti seja do tamanho da sua cabeça.
Que cabeça.
É lá que arrumam os carros quando chegam do trabalho?
Os dois juntinhos.
Claro que sinto a tua falta. Como não sentir?
A tua e a do estúpido do cão.
O cabeças trata bem do cão? Espero que sim .
No outro dia estive na Dona Maria...
Não está melhor. Vê muito pouco.
Perguntou por ti claro. Não quis entrar em detalhes.
Vou sentir a falta dela...
Lembras-te a quantidade de coisas que nos oferecia quando começámos a viver juntos?
Aquelas empadas deliciosas... o pão, os bolinhos com o café.
Quando digo que nada mudou, falo disso também.
Ando pelos mesmos sítios...
O “teu” café, o “teu” jardim”, lembras-te?
Disseste que tinha a maior pinta de sacana do mundo mas que te tinhas apaixonado por mim.
“Agora não há volta a dar!” , disseste.
Eu tinha bebido muito. E tinha vestido o tal casaco que odiavas.
“Pareces um desgraçado” .
Tinhas uma trança no cabelo não tinhas? Tenho quase a certeza.
O teu cabelo era tão claro como agora.
E o sorriso. Enorme.
As tuas mãos, que rapidamente se tornavam as minhas.
E o teu coração, que tantas vezes foi o meu.
E onde hoje não estou.

Sunday, January 16, 2011


Medo. Medo e palavras.
Demasiadas palavras. Palavras que cheguem para os dois.
Entre nós o Universo. Os “ses” que a levaram dos meus braços.
Da janela do meu quarto, aquele sorriso imenso de quem faz pouco do mundo.
Do outro lado da estrada, as palavras que nunca lhe entreguei em mão .
Ela é uma artista incrível .
Admiro todos os seus quadros.
Todos.
Não sei se terá algum dia a mínima suspeita. Duvido.
Sempre disfarcei bem.
O truque, sempre o mesmo.
A cada tela que me mostra, sorrio e acendo um cigarro.
“ Gosto “. “ Está bonito”.
“Já não me tinhas mostrado este”?
Sorrio sempre.
E ela sorri também.
Encolhe os ombros e oferece-me um café .
Foi assim durante anos.
Hoje não.
Mais uma tela, mais um cigarro e um par de sorrisos.
Em vez de café ofereceu-me uma conversa. Um minuto dos seus.
E falámos durante horas.
Sobre nós e sobre tudo.
Do mesmo lado da estrada, ela contou-me todos os seus sonhos.

E eu entreguei-lhe em mão os meus .

Friday, January 7, 2011

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Manhã. Frio.

De Segunda a Sexta . Todos os dias .

Sempre.

Responsabilidade e um ordenado .

O ordenado paga a renda, a renda paga a casa.

A casa paga as frustações de quem nunca se tornou naquilo que queria .

Manhã. Frio.

Uma viagem e um comboio .

Cheio de filhos da puta. Cada um com o seu destino.

Filhos da puta como eu.

Esperando,de quatro, que a vida traga algo de novo .

Rabos de banco e meio,

barbas,

perfumes diferentes,

sorrisos, poucos .

Mulheres com péssimo gosto para sapatos .

Guarda-chuvas,

casacos velhos,

pedreiros,

hospedeiras,

bancários,

a mãe que tem um filho em frança.

“Foi a vida que quis assim “ .

Sono,

comprimidos,

problemas,

maus hálitos,

a gravata que combina com a camisa,

e a mulher que já não combina com o marido, mas que por sorte se suportam .

A senhora carregada com os sacos de plástico,

e o senhor, de coração fraco, que deixou cair os olhos no decote da menina.

Ela ri-se. Gosta disso .

O namorado menos .

De manhã começa o dia .

Os queixumes,

o filho que estuda pouco,

a filha que namora muito,

o triste fado,

as saias aos quadrados,

o solteiro,

o casado,

o divorciado de fresco,

o adolescente apaixonado que não tira os olhos no telefone .

E a cabeça da lua .

Homens com péssimo gosto para bigodes .

Compromissos,

agendas,

lancheiras com filetes .

O rio ficou para trás.

Assim como a casa na praia ou as aulas de piano .

“Se eu pudesse voltar atrás...” .

Nunca voltam .

A senhora, que há um ano era menina, carrega hoje nos braços a benção que outrora julgou ser castigo .

E eu a fazer-me um deles, como se tudo aquilo me fizesse sentido.

Amanhã já não venho .

Se perguntarem por mim ?



Estarei de volta aos teus braços .

Monday, January 3, 2011

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Dá-me só mais um minuto. Prometo que não demoro .

Dá-me um resto do teu tempo,

sabes que a ti te custará pouco .

Dá-me um caminho diferente,

um coração novo,

prometo que to devolvo inteiro.

Dá-me força,

talvez um pouco de sorte e um copo de vinho.

Dá-me um destino certo,

uma estrada,

um novo sonho,

um mundo menos cinzento,o mais perto possível do teu peito.

Dá-me um propósito,

uma hora para chegar em ponto,

um par de asas e uma janela de onde possa avistar o mundo.

Sem que qualquer vaso se quebre .

Dá-me um cigarro dos teus,

um palácio,

um canto escuro,

e um amor como o dos filmes,

em que tudo termina perfeito.

Dá-me um daqueles teus poemas,

que escreveste quando ainda estávamos vivos .

Dá-me um pouco dessa luz com que enchias toda aquela sala .

A noite hoje está mesmo escura.



Como se tivessem partido a lua ao meio.