Wednesday, January 26, 2011

26 / 01 / 2011


Escrever, escrever, escrever.
Escrever por escrever.
E apenas por ter escrito.
Escrever para que saibas que escrevi.
Que ainda guardo em mim palavras tuas.
Escrever escrever escrever.
Escrever sem parar.
Escrever para sempre.
No papel e sobre a carne.
De dia e de noite.
Para o mundo e para o bolso.
Para o inferno onde me deixaste.
Escrever de medo e de fome.
E ter sempre fome de escrever mais.
Escrever,escrever,escrever.
Sobre todos os teus passos.
E os meus, quando andava por perto.
Escrever escrevendo.
Escrever sonhando.
Escrever, escrever, escrever.
É o que a vida quis para mim.
E só.
Escrever por mim e escrever por ti,que me deixaste a escrever sozinho.
Escrever,escrever,escrever.
E encontrar-te um dia destes.

Numa folha qualquer.

Sunday, January 23, 2011


Gostar dela e querer tê-la por perto para sempre.
Oferecer-lhe presentes.
Tornar cada dia diferente.
Envelhecermos juntos.
Cozinhar para ela.
Provar a sua tarte horrível vezes sem conta e dizer sempre que está óptima.
Bebermos vinho tinto até cair para o chão e, cheios de lama na roupa, trocar alianças ou abraços.
Ser amigo. Ser parceiro.
Contar-lhe sempre a verdade.
Que não era o mais forte da escola e que me fartei de levar pancada quando queria impressionar as miúdas.
Contar-lhe todos os meus segredos e mostrar-lhe as minhas cicatrizes.
Comprar um enorme sofá vermelho e fotografá-la nele vezes sem conta.
Guardar o seu sorriso no peito e levá-lo todos os dias para o trabalho.
Dizer que a sua pele continua perfeita ao fim de tantos anos.
Usar o meu melhor fato quando vamos ao teatro. Sorrir para a senhora da bilheteira só para a ver com ciúmes.
Vê-la a acenar da janela quando enfrento o frio cá fora, e provo que ainda sou um gajo forte.
Conhecer de norte a sul o seu corpo, e perder-me por lá.
Vezes sem conta. Propositadamente.
Fazer das mãos dela as minhas, e encostá-las ao meu peito.
Dizer-lhe que vou, mas volto.
Com o seu sorriso à minha espera.

Wednesday, January 19, 2011


Não funcionou.
Não tinha como. Foi muita coisa.
Não falo dos anos, esses passaram por nós a correr e da forma mais prazerosa possível.
Não funcionou, não tinha como, e agora estou aqui sozinho neste quarto do tamanho do mundo.
Não mudei nada. Esperei que o tempo tratasse de tudo.
Não tratou, claro.
Eu, continuo igual. Com tudo aquilo que tu odeias.
Não aprendi a estrelar ovos nem a cortar a relva.
Continuo a andar em casa em cuecas, e a exagerar no ketchup .
Continuo a escolher as gravatas erradas de manhã, e a chamar nomes às pessoas no trânsito.
Continuo a fumar muito. Na cozinha também.
O chão do estúdio continua cheio de livros. Os discos que o teu irmão me emprestou e que nunca mais devolvi.
O pior é mesmo a roupa.
Passar a ferro é difícil . As calças basta sacudir, mas as camisas...
Estar sozinho não é mau.
Voltei a usar o meu casaco de cabedal, que tentaste esconder no fundo do caixote duas vezes .
Esse mesmo.
Não vejo novelas nem como bróculos.
Os domingos deixaram de ter manhãs.
O quarto para além de maior, deixou de cheirar a Zara.
E a insenso.
Estar sozinho não é mau. O pior é ver-te.
A ti e ao gajo que te traz pendurada no braço, e que o usa o outro para me acenar.
O filho da puta.
Que o que sinta por ti seja do tamanho da sua cabeça.
Que cabeça.
É lá que arrumam os carros quando chegam do trabalho?
Os dois juntinhos.
Claro que sinto a tua falta. Como não sentir?
A tua e a do estúpido do cão.
O cabeças trata bem do cão? Espero que sim .
No outro dia estive na Dona Maria...
Não está melhor. Vê muito pouco.
Perguntou por ti claro. Não quis entrar em detalhes.
Vou sentir a falta dela...
Lembras-te a quantidade de coisas que nos oferecia quando começámos a viver juntos?
Aquelas empadas deliciosas... o pão, os bolinhos com o café.
Quando digo que nada mudou, falo disso também.
Ando pelos mesmos sítios...
O “teu” café, o “teu” jardim”, lembras-te?
Disseste que tinha a maior pinta de sacana do mundo mas que te tinhas apaixonado por mim.
“Agora não há volta a dar!” , disseste.
Eu tinha bebido muito. E tinha vestido o tal casaco que odiavas.
“Pareces um desgraçado” .
Tinhas uma trança no cabelo não tinhas? Tenho quase a certeza.
O teu cabelo era tão claro como agora.
E o sorriso. Enorme.
As tuas mãos, que rapidamente se tornavam as minhas.
E o teu coração, que tantas vezes foi o meu.
E onde hoje não estou.

Sunday, January 16, 2011


Medo. Medo e palavras.
Demasiadas palavras. Palavras que cheguem para os dois.
Entre nós o Universo. Os “ses” que a levaram dos meus braços.
Da janela do meu quarto, aquele sorriso imenso de quem faz pouco do mundo.
Do outro lado da estrada, as palavras que nunca lhe entreguei em mão .
Ela é uma artista incrível .
Admiro todos os seus quadros.
Todos.
Não sei se terá algum dia a mínima suspeita. Duvido.
Sempre disfarcei bem.
O truque, sempre o mesmo.
A cada tela que me mostra, sorrio e acendo um cigarro.
“ Gosto “. “ Está bonito”.
“Já não me tinhas mostrado este”?
Sorrio sempre.
E ela sorri também.
Encolhe os ombros e oferece-me um café .
Foi assim durante anos.
Hoje não.
Mais uma tela, mais um cigarro e um par de sorrisos.
Em vez de café ofereceu-me uma conversa. Um minuto dos seus.
E falámos durante horas.
Sobre nós e sobre tudo.
Do mesmo lado da estrada, ela contou-me todos os seus sonhos.

E eu entreguei-lhe em mão os meus .

Friday, January 7, 2011

.

Manhã. Frio.

De Segunda a Sexta . Todos os dias .

Sempre.

Responsabilidade e um ordenado .

O ordenado paga a renda, a renda paga a casa.

A casa paga as frustações de quem nunca se tornou naquilo que queria .

Manhã. Frio.

Uma viagem e um comboio .

Cheio de filhos da puta. Cada um com o seu destino.

Filhos da puta como eu.

Esperando,de quatro, que a vida traga algo de novo .

Rabos de banco e meio,

barbas,

perfumes diferentes,

sorrisos, poucos .

Mulheres com péssimo gosto para sapatos .

Guarda-chuvas,

casacos velhos,

pedreiros,

hospedeiras,

bancários,

a mãe que tem um filho em frança.

“Foi a vida que quis assim “ .

Sono,

comprimidos,

problemas,

maus hálitos,

a gravata que combina com a camisa,

e a mulher que já não combina com o marido, mas que por sorte se suportam .

A senhora carregada com os sacos de plástico,

e o senhor, de coração fraco, que deixou cair os olhos no decote da menina.

Ela ri-se. Gosta disso .

O namorado menos .

De manhã começa o dia .

Os queixumes,

o filho que estuda pouco,

a filha que namora muito,

o triste fado,

as saias aos quadrados,

o solteiro,

o casado,

o divorciado de fresco,

o adolescente apaixonado que não tira os olhos no telefone .

E a cabeça da lua .

Homens com péssimo gosto para bigodes .

Compromissos,

agendas,

lancheiras com filetes .

O rio ficou para trás.

Assim como a casa na praia ou as aulas de piano .

“Se eu pudesse voltar atrás...” .

Nunca voltam .

A senhora, que há um ano era menina, carrega hoje nos braços a benção que outrora julgou ser castigo .

E eu a fazer-me um deles, como se tudo aquilo me fizesse sentido.

Amanhã já não venho .

Se perguntarem por mim ?



Estarei de volta aos teus braços .

Monday, January 3, 2011

.


Dá-me só mais um minuto. Prometo que não demoro .

Dá-me um resto do teu tempo,

sabes que a ti te custará pouco .

Dá-me um caminho diferente,

um coração novo,

prometo que to devolvo inteiro.

Dá-me força,

talvez um pouco de sorte e um copo de vinho.

Dá-me um destino certo,

uma estrada,

um novo sonho,

um mundo menos cinzento,o mais perto possível do teu peito.

Dá-me um propósito,

uma hora para chegar em ponto,

um par de asas e uma janela de onde possa avistar o mundo.

Sem que qualquer vaso se quebre .

Dá-me um cigarro dos teus,

um palácio,

um canto escuro,

e um amor como o dos filmes,

em que tudo termina perfeito.

Dá-me um daqueles teus poemas,

que escreveste quando ainda estávamos vivos .

Dá-me um pouco dessa luz com que enchias toda aquela sala .

A noite hoje está mesmo escura.



Como se tivessem partido a lua ao meio.