Tuesday, May 3, 2011

03-05-2011



Hoje não a vi á janela.
Esperei horas escondido.
Saiu e entrou montes de gente.
Ela nada.
Sabia que este dia chegaria mais cedo ou mais tarde.
Que um dia pagaria por tudo.
Hoje não a vi à janela e sei que não a verei mais.
Custa-me muito claro. Não lhe disse tudo.
Nunca lhe disse tudo. Fui guardando muita coisa.
Palavras que ficaram para mais tarde.
Cartas. Piadas velhas.
Um poema foleiro num guardanapo:
Tu, que não és mais do que isso mesmo,
és para mim, tudo.
Braços, pernas, olhos e boca.
Um sonho, que é pesadelo ao mesmo tempo.
A morte mais doce de todas.
Um lenço bonito vermelho, que nem eu sei de onde vem.
O talão do nosso primeiro jantar.
Dois bilhetes de avião,
o Gets Next To You do Al Green,
sandálias,
uma Leica,
uma camisa de dormir,
um pack de Camel,
fotografias,
do Inverno, claro.
Intrigava-me o seu fascínio pelo Inverno.
O sorriso que trazia na cara quando chovia a potes.
Tenho também o seu guarda-chuva.
Nunca o usou. Odiava.
Hoje não a vi à janela e sei que foi de vez.
Que o meu tempo acabou.
Que nunca lhe devolverei o que é seu.
Que nunca saberá a verdade.
Que é, para mim, tudo.
Um pesadelo, que foi sonho ao mesmo tempo.
A morte mais doce de todas.